_20080314095707.pdf (Espanto x Indignação)
quarta-feira, 16 de abril de 2008
EDUCAÇÃO E CORRUPÇÃO: ENTRE O ESPANTO E A INDIGNAÇÃO
EDUCAÇÃO E CORRUPÇÃO: ENTRE O ESPANTO E A INDIGNAÇÃO
Fico abismado quando ouço comentários, seja na TV ou no mesmo dia-a-dia, transitando por todos os lugares, aqui e acolá, de pessoas que se dizem “espantadas” com a roubalheira de políticos, com a corrupção e a venalidade de juízes ou mesmo com a venda de atestados por médicos ou ainda com o mascaramento de suas imperícias, atuando em áreas em que não possuem especialidade alguma, etc.
Vejamos, há quem diga – creio, se a memória não me falha, tenha sido Paulo Coelho, no que, a despeito de quem seja, peço já licença pela menção – que uma traição é um golpe que não se esperava. E que se não se esperava, foi tanto mais um erro de quem desconhecia a natureza de quem traiu do que – de fato – de quem propriamente traiu.
Nossa "educação" não educa moralmente, isto é um fato. Nossa “educação”, a educação brasileira em geral, se resume – claudicante, diga-se – a uma educação que intelectualiza, mas não moraliza. Foca, por vezes tão-somente, o conhecimento lógico-matemático e o mero exercício mnemônico, nada mais. Pois bem, diante deste quadro, como então nos espantarmos com algo que seria mais que previsível?! Devemos nos indignar?! Sem dúvida! O espanto seria passar atestado de tolo.
A "educação" que o mercado prioriza (e a quem a academia tem sido servil) visa a intelectualização. E grandes intelectuais podem muito bem serem grandes criminosos, nada obsta, quer falemos disto como pendor inato ou não, fruto da influência do meio ou não, o que já seriam outras questões. Nossa educação não prepara os educandos para a convivência social, apenas instruindo, intelectualizando... Quem aqui já ouviu falar de aferição moral de um juiz ou político para assumirem tais cargos? No máximo sua ficha criminal deve estar "limpa", sendo certo que, os "melhores" (mais hábeis) criminosos permanecem sempre com sua ficha limpa. Mas, certamente, se quer saber se ele é capaz – sob o prisma intelectual – para administrar o erário ou se tem conhecimento suficiente das leis para julgar, muito embora possa muito bem fazer uso destes conhecimentos (intelectuais) para burlar o sistema.
Ora, desbanalizar o banal, para usar a feliz expressão do prof. Paulo Ghiraldelli Jr., tratar todos os temas como dignos de abordagem filosófica (filosofar sobre tudo) parece ser mesmo o mote da Filosofia. Agora, espantar-se com algo que, pelo próprio curso das coisas, seria de se esperar, é não enxergar um palmo além do próprio nariz.
É... parece que o Sócrates de Platão tinha razão: filosofar é inútil e o homem justo também o é. Filosofar e ser justo não possuem utilidade alguma, porque são categorias que não se subsumem aos lindes estreitos do utilitarismo (senão por sua supra-utilidade: a formação integral e progressiva do homem), eis que, quando se precisa de políticos quer-se bons administradores; de médicos, pessoas tarimbadas no exercício da medicina; um juiz, aquele que passe com as melhores notas numa prova que equaciona – tão-somente – sua inteligência lógico-matemática, sua capacidade mnemônica e seu talento argumentativo, não o seu caráter. Nunca se pensa, eu quero um médico moralmente correto, um juiz equânime, ou um político honesto.
Diante disto, como, então, nos espantarmos se eles se tornarem criminosos?! Se não nos preocupamos em lhes fornecer (ou ao menos exigir) uma base moral qualquer.
Indignarmo-nos, sem dúvida, nos espantarmos, não!
FRANCISCO DE SOUSA VIEIRA FILHO[1]
Também disponível em:
http://www.portalodia.com/jornal/pages/pdf_14-03-2008_6_20080314095707.pdf (Espanto x Indignação)
[1] Francisco de Sousa Vieira Filho é advogado em Teresina-PI, militando na área trabalhista, professor de Filosofia Jurídica e Criminologia (FAESF – Floriano-PI), especialista em Direito Constitucional e mestrando em Direito pela Universidade Autônoma de Lisboa – UAL.
Marcadores:
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