As criaturas e por tal sutileza
sábado, 27 de fevereiro de 2010
PÃO
PÃO
Como que criado em suplício
Dor e vazio se lhe consomem
Luta severa e sem armistício
De cujo saciar não há indício
O que se denomina o homem
É o que se o define de início
E arde em ânsia e em desejo
Por tudo o quanto lhe rodeie
E de paz em si não há ensejo
Nem bálsamo que a isto freie
No que é mais seu, a natureza,
Sem que se possa dizer ilidem
A porção de sua torpe baixeza
Ao Ente que lhe cedeu beleza
Marcou para que a si lapidem
As criaturas e por tal sutileza
As criaturas e por tal sutileza
É como segue o ente humano
Que tudo quer e a tudo busca
Na proporção de um oceano
Francisco de Sousa Vieira Filho
FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p. 25.
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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
POEMETOS DA HORA DERRADEIRA
EQUILÍBRIO
Sob a égide do medo,
Se deixa de viver;
Quem vive sem prudência,
Por certo,
[igual pecado]
Logo há de fenecer.
Equilíbrio delicado
Desperto
Como se tal ciência
Revelasse o que há de ser.
Francisco de Sousa Vieira Filho.
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REDENÇÃO
A aceitação do erro,
Da falibilidade humana,
É o que nos absolve...
Cativeiro semicerro
Que aos incautos engana,
Quando então nos volve,
É a santidade distante,
O irrealizável guante
Imposto por não-santos,
[Como nós]
A despeito sejam tantos,
[Também sós!]
O que mais ainda lhes condena
E só lhes assoma a pena.
Francisco de Sousa Vieira Filho.
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ARTE: http://data.tumblr.com/0ZEBnoQrc67dkc24ZvySUokC_400.jpg
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O SEGREDO DO ABISMO
E pelas vagas seguirei inconformado,
Negando-me até o menor linimento,
Se me oculta o rumo, o firmamento.
Tão certo quanto a amplidão do mar,
Se é vivendo que se aprende a viver,
Que por certo é imprescindível crer.
Preciso se faz beirar o tredo abismo
E saber menos dista o distante cume
De um tal lugar, sem qualquer lume
Num tal buraco que não tenha fundo
Que se saiba ser inútil se desesperar
Que isto não é nunca o fim do mundo
Francisco de Sousa Vieira Filho
FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p.11..
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terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
VENDETTA
VENDETTA
(a Felicidade de Goethe e a dor de Ihering)
I
Não chores por ter sido tu
Por outrem, calcado aos pés
Outro dia ainda nasceste nu
E isso não te foi por revés
Os que julgam fazer-te o mal
Não angariam sequer vinténs
Do maior bem celestial
Lutando por tesouros desta terra
E bem longe do Tesouro jazem
Se em todo mal que perfazem
Tamanha tristeza encerra
II
É com o esvoaçar das pétalas da rosa
Que se percebe ali todos os males
Não estando enxertos na fibra aquosa
De que nos falava um certo Tales
Sendo a vida a doce infância
Desses seres de essência imortal
Encerrada num corpo simial
Desperta, ó criança, sem temor:
Nasceste pra saber que um dia perderás
Tudo a que nesta vida te apegas e dás valor
E o Tesouro da Verdade cultivarás
Sem de novo sentir fome, frio ou dor
Francisco de Sousa Vieira Filho
FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p.17 e 18.
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PLURISSIGNIFICAÇÕES PLURISSIGNIFICANTES
PLURISSIGNIFICAÇÕES
PLURISSIGNIFICANTES
A Ludwig Wittgenstein
Faz escorrer nos escombros destes cinzéis
O que pareceria seja morta a muda língua
No borbulhar de tinta bruta, os mil pincéis
De uns cem mil signos plurissignificantes
Num entorno louco de verborragia frágil
E já nem se diga o que é que fora dantes
Molda em pedra o cárcere pedregoso chão
E faz com que do espelho na parede eflua
De tais palavras, inda que a menor noção
Francisco de Sousa Vieira Filho
FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p.69.
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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
ESPELHO
ESPELHO
Não é com desdenhoso pouco espanto
Que se constata a distorção do espaço
Raro se desfigurar o rosto a cada passo
Subcutâneo nervo, alma e cada canto
A constatar com que natural desvelo
Náusea, ânsia, choque, fúria e pesadelo
De chofre, é que nos mostram o quanto
Em frágil e débil andor de barro, o santo
Na abissal ignorância é que se compraz
Infantil joguete de um infértil nomos
Fruto do quanto o ego dominus loquaz
Faz diversa a tosca imagem do que somos
Que se brada a altivez do espelho canho
Se refestela’lma na putridão de antanho
Francisco de Sousa Vieira Filho
* "Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido." (I Coríntios 13:12)
** "Ver Tambem: SOBRE TENDENCIOSIDADE - http://dialogospoeticosimello.blogspot.com/2010/02/sobre-tendenciosidade.html
** "Ver Tambem: SOBRE TENDENCIOSIDADE - http://dialogospoeticosimello.blogspot.com/2010/02/sobre-tendenciosidade.html
ARTE 1: Capa do CD - Imaginations from The Other Side, da banda Alemã Blind Guardian
ARTE 2: Luiz Royo
ARTE 2: Luiz Royo
O PROFETA
O PROFETA
A Goethe
Cabelos esvoaçantes feito sarças
Espalhado, como elas, pelo vento
Está ele a todo tempo pelas praças
Apregoando e sempre o bom alento
E impostando a voz que o nó desata
Dos tormentos e das dores e das chagas
Os pobres e os humildes vindo à cata
Ele chama pra bem longe dessas pragas
Sabendo que pra esse fim nasceu de novo
Com a Verdade com que foi presenteado
É com Ela que há de ser também seu povo
Pras dores desta lida tem sido amortizado
Pois como é para a ave, a casca do ovo,
O sofrimento é para o sábio aprendizadoFONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p. 19.
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domingo, 21 de fevereiro de 2010
RESSUSCITANDO OS INAUDITOS
MEIO ASSIM...
Me sinto meio assim
Quando te dói em mim
Que sou teu meio-tudo
Se fico meio-mudo,
Tu falas por mim
Que sou teu meio-pai
E teu meio-amigo
Um meio teu irmão
E também inteiro-amante
Teu servo, meio-cão
Aonde for te sigo
E nesse meio estou
Um meio que teu filho
Por fim, se nessa arte
Exato meio eu sou
És tu aquela parte
Daquilo que me vou
Francisco de Sousa Vieira Filho
DESEJOS
Só um desejo oculto por vez
É que se revela
Por menor o toque, em tua tez
Tão alva e bela
O de querer te abrir a mente
Ou te escancarar as pernas
De um ou outro se pressente:
No negrume de cavernas,
Um se aterra e se oculta;
No alçar vôo e içar velas,
Outro assoma e avulta;
Por ambos
Em ti mergulho
Descambos
De meu orgulho
Um é sol
E o outro é lua
O crisol
E a fome tua
Se um vem, o outro se ia
Também morre e o outro vai
Mata a fome e se sacia
Estertor de um simples ai
De quem assim sente
E a si sente
Em eterno ciclo
E constantemente
E se em ti florir
Eu quereria
Florir-te-ei
Florir-te-ia
Francisco de Sousa Vieira Filho
Me sinto meio assim
Quando te dói em mim
Que sou teu meio-tudo
Se fico meio-mudo,
Tu falas por mim
Que sou teu meio-pai
E teu meio-amigo
Um meio teu irmão
E também inteiro-amante
Teu servo, meio-cão
Aonde for te sigo
E nesse meio estou
Um meio que teu filho
Por fim, se nessa arte
Exato meio eu sou
És tu aquela parte
Daquilo que me vou
Francisco de Sousa Vieira Filho
DESEJOS
Só um desejo oculto por vez
É que se revela
Por menor o toque, em tua tez
Tão alva e bela
O de querer te abrir a mente
Ou te escancarar as pernas
De um ou outro se pressente:
No negrume de cavernas,
Um se aterra e se oculta;
No alçar vôo e içar velas,
Outro assoma e avulta;
Por ambos
Em ti mergulho
Descambos
De meu orgulho
Um é sol
E o outro é lua
O crisol
E a fome tua
Se um vem, o outro se ia
Também morre e o outro vai
Mata a fome e se sacia
Estertor de um simples ai
De quem assim sente
E a si sente
Em eterno ciclo
E constantemente
E se em ti florir
Eu quereria
Florir-te-ei
Florir-te-ia
Francisco de Sousa Vieira Filho
CORPUS CIRCENSIS
Para o amor, eu hei perdido o tato.
Que na peça da vida então me resta,
Se é só o encenar de um simples ato?
Deixar de a tudo antever pela fresta
É como melhor posso resumir o fato.
Se me basta, só, o ardor das meninas,
Adejo pra bem longe todo o fino trato
E me atraco feroz em suas ancas ferinas.
Francisco de Sousa Vieira Filho
ÂNSIA
Fome de ti
Sede de ti
Brilham no olhar
Dançam nas lágrimas
Escorrem nas páginas
E mesmo antes
De o solo tocar
Morrem
Ainda no ar
Francisco de Sousa Vieira Filho
ÚLTIMO LANCE
Lancei na tela cinza destes dias
Antes fosse fúria, antes desespero
Tão fartas cores e com tal esmero
O que pensei que só tu poderias
E a divisar sob essa leve cortina,
O que pra bem longe dessa sina
Quero espraiar tudo o que de bom
E fazer ecoar minha voz, o som
E o que de mais puro e belo há
Em mim, em ti se faça o atiçar
Como se um talhe do teu beijo
Aquele derradeiro, que deixou
Rasgue novamente o que ficou
Francisco de Sousa Vieira Filho
DIRETA
Ah, se essa dor de não te ter
Transladasse o espesso vão que há
Entre a vontade e o agir, a se fazer
Como se coisa real em seu lugar
A mais do que com os olhos entreter
[Tocar, cheirar, beijar, morder]
Pusesse então diante a me mostrar
O fulgor que habita neles, bem-querer
Estrangulando esse desejo de sumir
E em si fazendo novo o velho ar
Viria a uma vez mais te consumir
O que persiste em mim, a ti arder
Vontade de assim poder te amar
E só então nos poderemos possuir
Francisco de Sousa Vieira Filho
FOSSO
De explorar a geografia branca
Algo recurva de teu dorso
E nas tênues covas de tua anca
Demorar-me, resoluto
E tal seja o esforço
Sei que sentes
Quanto luto
Se entre dentes
Com uma rosa afagar-te
O rosto
É a ânsia de assim amar-te
Qual um corso
Porque amar
Ah... amar é fosso!
Francisco de Sousa Vieira Filho
SENTIDO
Das metas tuas, só metades
Se a ti eu peço: traga tudo
É que, por certo, eu trago tudo
Em borrifadas muito fartas
De nuvens extáticas de sonhos
E em longos e massivos haustos
Seguimos desatinando os nós
E por fim desafogamos sós
Dos temores mais medonhos
E assim se vai
A vida
Francisco de Sousa Vieira Filho
BRASÃO
A solidão ardente prega peças
Intensifica sentimentos poucos
Cria outros sentimentos tantos
Engana, mente e faz pareças
Vagar a esmo pelos cantos
Francisco de Sousa Vieira Filho
Para o amor, eu hei perdido o tato.
Que na peça da vida então me resta,
Se é só o encenar de um simples ato?
Deixar de a tudo antever pela fresta
É como melhor posso resumir o fato.
Se me basta, só, o ardor das meninas,
Adejo pra bem longe todo o fino trato
E me atraco feroz em suas ancas ferinas.
Francisco de Sousa Vieira Filho
ÂNSIA
Fome de ti
Sede de ti
Brilham no olhar
Dançam nas lágrimas
Escorrem nas páginas
E mesmo antes
De o solo tocar
Morrem
Ainda no ar
Francisco de Sousa Vieira Filho
ÚLTIMO LANCE
Lancei na tela cinza destes dias
Antes fosse fúria, antes desespero
Tão fartas cores e com tal esmero
O que pensei que só tu poderias
E a divisar sob essa leve cortina,
O que pra bem longe dessa sina
Quero espraiar tudo o que de bom
E fazer ecoar minha voz, o som
E o que de mais puro e belo há
Em mim, em ti se faça o atiçar
Como se um talhe do teu beijo
Aquele derradeiro, que deixou
Rasgue novamente o que ficou
Francisco de Sousa Vieira Filho
DIRETA
Ah, se essa dor de não te ter
Transladasse o espesso vão que há
Entre a vontade e o agir, a se fazer
Como se coisa real em seu lugar
A mais do que com os olhos entreter
[Tocar, cheirar, beijar, morder]
Pusesse então diante a me mostrar
O fulgor que habita neles, bem-querer
Estrangulando esse desejo de sumir
E em si fazendo novo o velho ar
Viria a uma vez mais te consumir
O que persiste em mim, a ti arder
Vontade de assim poder te amar
E só então nos poderemos possuir
Francisco de Sousa Vieira Filho
FOSSO
De explorar a geografia branca
Algo recurva de teu dorso
E nas tênues covas de tua anca
Demorar-me, resoluto
E tal seja o esforço
Sei que sentes
Quanto luto
Se entre dentes
Com uma rosa afagar-te
O rosto
É a ânsia de assim amar-te
Qual um corso
Porque amar
Ah... amar é fosso!
Francisco de Sousa Vieira Filho
SENTIDO
Das metas tuas, só metades
Se a ti eu peço: traga tudo
É que, por certo, eu trago tudo
Em borrifadas muito fartas
De nuvens extáticas de sonhos
E em longos e massivos haustos
Seguimos desatinando os nós
E por fim desafogamos sós
Dos temores mais medonhos
E assim se vai
A vida
Francisco de Sousa Vieira Filho
BRASÃO
A solidão ardente prega peças
Intensifica sentimentos poucos
Cria outros sentimentos tantos
Engana, mente e faz pareças
Vagar a esmo pelos cantos
Francisco de Sousa Vieira Filho
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010
A DANÇA DO UNIVERSO
A DANÇA DO UNIVERSO
No limiar maior da razão se alcança
A percepção de inaudível melodia
Ao sabor da qual o universo dança
Desde aquele seu primeiro dia
Da mítica figura divina hindu
Delineia-se, então, o corpo nu
Na silhueta metafórica de Shiva
A intuição de toda estrutura viva
E nesse ensejo da Razão que luzia
Brota no entrechoque de átomos
A semente da mais intensa harmonia
Relembram-nos, assim, o que fomos
As mãos de Deus, em tão bela melodia
Imersas, a escrever primeiros tomos
Francisco de Sousa Vieira Filho
FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p. 21.
ARTE: Luke Brown - Mantis Dakini
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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
ERMO - ÉDEN PERDIDO
ERMO – ÉDEN PERDIDO
Palmilhar é o que arde ao peito do andejo,
Que sob lua enigmática nos céus reinante,
Num murmúrio derradeiro, é seu lampejo,
Qual se lhe falasse voz profética, sibilante.
É que lhe sussurra num silêncio benfazejo
A muda voz que dum coração retumbante
Lhe grita n’alma seu mais pungente desejo
O de persistir e caminhar a todo instante.
E abafa um resmungo mudo, inútil arpejo,
Sonhando se lhe restaure o status quo ante,
Mesmo se lhe dobrem os joelhos, arquejo,
Insiste só querer dali partir se triunfante.
E intenta em vão prosseguir ante o bodejo
Dessa estranha e muda voz que tão falante
Prossegue a lhe tanger à força, murmurejo
De como bem se vive a vida, ó caminhante:
Se de cada espinho em flor sinta o dardejo
E se te perfurem as pedras em dor ululante
O que se te parece ser caminho malfazejo
É o que te fará de novo puro qual infante
Que pra bem longe deste humilde lugarejo
Longa paz que se te haverá, amigo-errante.
Tu verás que bem mais há, pobre cabanejo,
Ao se te restaurar aquilo que já fora dantes.
FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p. 9.
ARTE:Fire Bird - http://artisalma.deviantart.com
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'Haicai' - filho único
'E a quem queira definir a poesia
Tanto mais se afasta
Tanto mais se distancia'
Francisco de Sousa Vieira Filho
Post-scriptum: lembrando cá uma passagem de Kahlil Gibran em que questionava o que teria sido do primeiro poeta ao largar o arco e divisar a beleza de um nascer ou pôr-do-sol e tentar explicar [com palavras] isso [que sentia] para seus companheiros de armas [quase todos guerreiros rudes e via de regra insensíveis]... provável daí tenha surgido a figura do skäld nórdico, uma espécie de guerreiro-bardo...
Post-scriptum II: na versão do Henrique Pimenta:
'Quem quer definir a poesia?
Quanto mais se aproxima
tanto mais se distancia'.
Show de bola!..
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haicai
DE QUERER A DOR INTEIRA
DE QUERER A DOR INTEIRA - I
Bem antes que me tomem masoquista
Apelo vejam o quanto a dor benquista
É que desnuda a alma, as roupas rotas
E tanto mais não venha a conta-gotas
E é bem por isso que digo 'quero a dor'
E se a quero, quero-a toda e ela inteira
Que nem de longe escapa a seu horror
Quem só dela foge sem eira nem beira
E tanto melhor que dela se prove tudo
Sendo de uma vez só, eu não me iludo
É ter o seu fulgor a embriagar na veia
Que tão menos prolongada faz sua teia
Francisco de Sousa Vieira Filho
FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p. 32.
ARTE:: unknown
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terça-feira, 16 de fevereiro de 2010
EVOLUÇÃO
EVOLUÇÃO
Em berço pétreo é a semente nua
Da luz, nos céus acima, desejosa
Qual o homem que por vez intua
A espinhosa trilha ser formosa
Indiferente de saber a senda sua
E displicente ao quanto tortuosa
Aquela que amanhã ele conclua
Ou que lhe advenha tormentosa
Pois que talvez sede inda possua
Ao ver da trilha finda, a maviosa
E a dor que da alma quer se exclua
Não tarda arder ao peito sequiosa
E jaz na insatisfação de todo sua
A eterna humana busca, honrosa
Sonha, crê e quer que se conclua
A sua jornada eterna e vagarosa
E a semente que repousa na fruta
Qual no homem átomo ao arcanjo
Quer tão logo renascer-se arguta
A natureza refazer o novo arranjo
Francisco de Sousa Vieira Filho
ARTE: Luiz Royo
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segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010
VISUM ET REPERTUM
VISUM ET REPERTUM*
“Only the good die young
All the evil seem to live forever.”
Se de fato o que mede um homem
É a coerência entre o que pensa e fala
Antes que numa cruz se te tomem...
De bom grado eu te aconselho: cala!
E se por certo a ocorrência é rara
É que no ébrio louco se consomem
Santos homens que só vivem para
Coisas que em nós rareiam, somem
É que nos falta a precisa medida
De ousar ser chamado louco
Para bem viver a vida
E ainda que seja breve a partida
Tão cara virtude é pouco
Em tão honrosa lida
ARTE: Félix da Silva - http://felixdasilva.deviantart.com/art/Madre-Teresa-17344559
* Visum et repertum = ver e repetir
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SANTO
SANTO
Ao pesar da armadura ele cai, genuflexo,
Sendo tal esta carga que o dorso lhe verga
E se toca o alforje, derradeiro o reflexo,
Pensa só no tesouro que a alma lhe alberga
Despe a casca, dura matter que enverga
Finca a espada, quase parte do plexo
Mãos ao cajado, o caminho não posterga
E à imensidão é que oferece um amplexo
Partido o escudo e sua lâmina fendida
Pra cura de suas dores, não tarda a ida
Do que lhe pulsou n’alma, agudo dardo
Uma fuga dos horrores, tal fora o fardo
E qual extrema-unção, bálsamo à ferida
Penitente é que prossegue em sua lida
Francisco de Sousa Vieira Filho
ARTE: Gimenez
ARTE: Gimenez
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domingo, 14 de fevereiro de 2010
BRINCADEIRA DE CARNAVAL
BRINCADEIRA DE CARNAVAL
Se redescobre, enfim, o que procuro
Em teu incerto, assim, cima-do-muro
A boca ardente que ora me faz bardo
E o teu sorriso quente, acúleo dardo
Seja o tesouro, ao fim, tua pele rubra
Em tal fulgor, por fim, te redescubra
O suave arrepio que te fibrila ao seio
Ao menor toque e o mais leve meneio
Ao menor toque e o mais leve meneio
No bom volteio, afim, teu corpo rubro
O vai-e-vem, de mim, com que te desço
Vendo teu corpo, em mim, eu emudeço
E com o suor marfim, com que te cubro
Embebido amor, de que não me esqueço
É que, em teu colo ardente, eu desfaleço
Francisco de Sousa Vieira Filho
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